Você já experimentou imaginar como seriam as religiões se, no lugar do dogma da fé, tivessem o dogma do esclarecimento? Se as religiões não tivessem mistérios, mas a verdade claramente respondida a cada pergunta?

Pergunto porque entendo que faz bem verificar quais pontos das tradições dos mais velhos são adequados para orientar os mais novos. Imaginar como seria a humanidade se algum dogma fosse diferente é o primeiro passo na promoção de melhoria.

Sobre a reflexão que proponho, não é difícil para quem acredita em outro dogma da Bíblia. É o que venho observando nos últimos 60 anos. É o que me levou a escrever o romance Os Limites da Crença. Há um  dogma fundamental no judaísmo, no cristianismo e no islamismo. Um dogma que, se levado a sério, não haveria mais o dogma da fé. É o dogma de que Deus é o criador de tudo. 

Você pode experimentar levar a sério esse dogma? Aceitar, por um momento, suspender sua descrença? Experimente pensar comigo.

Se Deus criou todas as coisas, ele criou os complexos sistemas de comunicação de nosso organismo. Desde o código genético, com as orientações com que a criança se forma no útero materno. Com isso, nascemos com sensores por todo o corpo para receber os sinais do mundo externo e sinais internos ao organismo. Sensores de tato para detectar diferentes contatos, como calor, pressão, separando o que incomoda de o que é carinho. Percebemos infinitos tons de claro e escuro e de cores. Distinguimos cheiros e sabores. Reconhecemos variações emocionais nas falas e nas músicas. Percebemos posição do corpo e sintomas fisiológicos. Por fim, temos cerca de 80 bilhões de neurônios na cabeça, com que podemos analisar e desenvolver entendimento com as informações recebidas. 

Tendo sido capaz de criar todo esse sistema de comunicação em nosso corpo, Deus entende muito de comunicação. Levando a sério que Deus se dedicou a criar todo esse sistema de comunicação, é de entender que ele usaria esse sistema para se comunicar com as pessoas. Assim realizaria a expressão atribuída a Jesus em João 8:32: “conhecerão a verdade, e a verdade os libertará”.

Substituindo o dogma da fé pelo dogma do esclarecimento, governantes que valorizam o esclarecimento serão transparentes e verdadeiros com os cidadãos. Instituições públicas e privadas serão sinceras com públicos de seus relacionamentos. Judaismo, cristianismo e islamismo não teriam tantos conflitos. Não teríamos tantos conflitos dentro do cristianismo, não haveria desentendimento de cristãos ameaçando outros cristãos, como tem acontecido no Brasil. 

O dogma da fé, que prega acreditar sem conhecer, pode estar estimulando imaginação que desqualifica o outro. Desqualifica outras pessoas que tiveram imaginações diferentes por meio da fé, outra fé. O dogma da fé desqualifica, inclusive, o Deus criador de todas as coisas. 

Pregar que Deus exige a fé é limitar a crença no Deus criador de todas as coisas, como se ele não soubesse se comunicar com as pessoas pelo sistema de comunicação que ele mesmo criou.